José Eduardo Gibello Pastore
Os novos modelos de trabalhos e a bolha do emprego no Brasil
José Eduardo Gibello Pastore
Advogado, consultor de relações trabalhistas e sócio do Pastore Advogados
O Direito do Trabalho no Brasil é hermético, fechado. Vive numa bolha chamada "emprego" e luta para não sair. Seus doutrinadores, não raro, rechaçam mudança da realidade do trabalho com vínculo de emprego. Agarram-se aos princípios celetistas de 1943, como se fossem os únicos. E, quando se veem diante de mudanças, atacam-nas como se fossem a encarnação do mal. Entendem que as mudanças são, inclusive, feitas para atingir de morte os princípios que regulam o direito do trabalho e para literalmente acabar com os trabalhadores. Entendem as mudanças de modo passional, como um ataque quase que pessoal.
Se o STF entende, por exemplo, que a contratação de pessoas jurídicas é possível para os profissionais que fazem contratos com salões de beleza, parte dos doutrinadores do Direito do Trabalho reagem histericamente, afirmando que se consolidou a fraude. Se decide que médico pode constituir pessoa jurídica para trabalhar em hospitais, brotam ataques afirmando que se instalou a barbárie no mundo do trabalho.
As palavras "flexibilização", "modernização" e "avanço" são, para os que lhes têm ojeriza, sinônimo de "desregulamentação", "precarização", "fraude", "ilegalidade", "inconstitucionalidade" e até "imoralidade".
Se o STF decide que um advogado pode ser sócio de um escritório de advocacia sem que isto signifique presumidamente fraude, em seguida parte dos doutrinadores trabalhistas jogam pedra no condenado _ a decisão do Supremo _ afirmando que se trata de absurdo, despautério e "retrocesso". Partem do princípio de que a contratação de advogados como sócios é sempre movida pela má-fé do dono do escritório, como se a fraude pudesse ser presumida.
Se a lei dispõe que "a atividade assalariada não é a única forma de caracterização da profissionalização do atleta, do treinador e do árbitro esportivo, sendo possível também definir como profissional quem é remunerado por meio de contratos de natureza cível..." (Lei 14.597, de 14 de junho de 2023, que institui a Lei Geral do Esporte), pronto: atacam a lei, o Legislativo, os deputados, os senadores que a votaram, dizendo que se trata de flagrante desproteção do trabalhador, o que evidentemente não é.
Se o STF decide que a atividade dos trabalhadores de aplicativos é de natureza civil, e não trabalhista, é o suficiente para se iniciarem fortíssimos ataques, como se a Corte Superior estivesse dizendo barbaridade jurídica, como se pudesse só existir o trabalho digno com vínculo de emprego, subordinado.
Se o trabalho autônomo com exclusividade, dependência econômica e habitualidade pode ainda ser considerado autônomo, vêm logo alguns ligeiros doutrinadores dizer que se trata de fraude. Os técnicos PJs de tecnologia da informação _ autônomos, que implantam um sistema em uma empresa, o que leva meses, têm habitualidade, pessoalidade, dependência econômica, mas não subordinação durante esse período porque sabem o que têm que fazer. Este exemplo mostra que o artigo 442-B da CLT sobre trabalho autônomo está correto. Ele desmistifica a ideia de que tudo é fraude.
A principal regra que regula a CLT está no artigo 3º da CLT, que prevê o único modelo de trabalho: aquele com vínculo de emprego. Este é o modelo de 1943, antigo, que certamente existe e se manterá, mas não é e nunca será o único. Imaginar que existe um único modelo de trabalho é achar que todos os outros novos modelos são fraudulentos e precisam se ajustar a ele. É o mesmo que querer calçar sapato 35 num pé 40. Ou se calça o sapato certo, ou se fica descalço. Ou se compreende que o mundo do trabalho está mudando e que novas modalidades de contratação fora do trabalho subordinado são possíveis, legítimas e legais, ou se mantém a crença de que estes novos modelos devem se encaixar no antigo celetista de 1943, colocar o sapato 35 no pé 40. Todos ficarão descalços.
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